Confira o texto.
Sr. Ricardo Boechat,
Diante do exposto, após ouvir seu áudio atentamente, agradeci por viver num Estado laico, onde ainda se pode manifestar ideias e pensamentos com liberdade de expressão.
Vamos falar inicialmente sobre a minha profissão, pois dela eu entendo as peculiaridades… Não apenas as teóricas, mas práticas, porque ao longo de quase 17 anos de carreira, vi e vivi muita coisa…
Sou primeiro sargento, tenho como especialidade a ENFERMAGEM , sou esposa de um militar que voluntariamente se alistou para compor a equipe de paraquedistas. Somos pais de três pequenos. Cito minha família para que o senhor comece a perceber a diferença desde agora. Num caso de colapso, de guerra e afins, meus três filhos ficarão aos cuidados dos avós, porque nós juramos que defenderíamos este solo, ainda que nosso sangue tivesse que jorrar por ele.
Sei que o Brasil vive tempos de paz, como o senhor mencionou em seu áudio, mas sinceramente… Isso é só na visão utópica de um jornalista mal informado! Um lugar onde se morrem mais de 2000 pessoas vítimas de violência em um ano não é um lugar de Paz! Pergunte a mãe do João Hélio se o país onde ela está é um lugar seguro. O senhor lembra quem é João Hélio? Lembra que os policiais que foram fazer a segurança do local alguns dias depois do incidente foram fuzilados brutalmente?
O senhor se recorda do cabo do Exército Brasileiro que foi morto na Maré combatendo a violência e preparando o Rio de Janeiro para se tornar a “cidade olímpica perfeita”? Não! O senhor não se recorda, afinal vivemos em tempos de PAZ!!!
Mas voltando aos militares das Forças Armadas… Nós não nos aposentamos com 25 anos, policiais sim. E sinceramente acho justíssimo. São eles que não possuem sequer o direito de deixar um seguro de vida para suas filhas e esposas. Bancos não os querem como clientes! Certamente dariam prejuízo, pois são alvos. O senhor sabia disso? Policiais são CAÇADOS, Sr. Boechat! São eles que expõem suas vísceras pra gente como o senhor tecer comentários num telejornal… De terno e gravata, em ambiente com ar condicionado, andando em carros blindados e comendo nos melhores restaurantes, não se percebe o caos.
Quanto à atividade de risco, pesquise mais! O senhor sabe o que significa pegar malária, leishmaniose, e doenças sequer catalogadas no CID por servir em regiões inóspitas e endêmicas? O senhor sabe o que é navegar Amazônia a dentro para levar remédio a fim de tratar desnutrição, verminose, marasmo, kwashiokor? O senhor sabe o que é pousar em cima de uma mata fechada e abrir um clarão no meio da Amazônia pra que famílias tenham dignidade ao enterrar seus filhos, pais e maridos, Sr. Boechat? Os militares deram a oportunidade dessas pessoas se despedirem dos seus amores! Lembra do Gol 1907?
Eu já fiz Missão de Misericórdia… Já catei piolhos em desnutridos… Já abri mão de comer a maçã do rancho para dar pra uma criança com fome! Já chorei! E muito! Perdi um amigo saltando… Treinando para defender a pátria que hoje ultrajam e mancham com a corrupção!
Já fiquei sem marido, e já agachei para fazer curativos nos seus pés esfolados cheios de sangue pisado por manobras com boot… Boot marron, sujo de sangue, suor e lágrimas de saudade da família ou de uma comida quentinha saindo do forno! Porque em missão, comemos ração! Exatamente! Estamos sempre prontos para cumprir qualquer missão!!!
Mas agora falando da sua profissão… Antes de divulgar qualquer opinião ou ideia, um jornalista, deveria se informar! Procure saber sobre modificações na LRM em 2000. Filhas de militares perderam o direito de receberem pensões! Perdemos qualquer tipo de gratificação ou licença especial por tempo de serviço. O que não perdemos foi o orgulho de sermos quem somos, a chama de proteger o nosso país, o amor por este solo e o senso de valores, justiça e vida! A nossa vida, Sr. Boechat é dedicada para que outros possam viver!!!
Atenciosamente, um Militar a cumprir seus 30 anos de serviço.
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